Monday, October 17, 2011

a dor complementar




já vivi a barreira infinita do descaso e dos brilhantes. numa febre afetiva escolhi aquele sonambulismo que contrariava meus desígnios de aprendiz. cintilei sabores de cama e cozinha num tear suspenso de querer ser mais familiar. recobrei as dívidas na convivência. paguei os meus defuntos tristes de outrora com esta história de tentar ser feliz, olvidando injúrias e estigmas pela aragem simples de sublimar os meus desvios. fiz caiar paredes de dias absortos, em que a paixão se destilava em lágrimas. detetive de vindas, perguntava de onde aquela correspondência amorosa surgia, quem acompanhava dos bastidores a obra arqueira do meu do sentimento aflitivo, manifesto em tão sensível agonia, de nunca se realizar al dente. respondi enquetes,  jejuei nas festas, perdida como num quintal de entulhos procurando a boneca manchada, sem termo de alguma revelação especial, primorosa, em que os pássaros se amontoam na imensidão solar de um aconchego pleno. quis vender meus venenos, livrar-me do estio que viria com os meses, daqueles arcanos da disputa e do empobrecimento da alma. só havia o revide das minhas tentativas e o plano estanque de uma família, filhos, carrinhos de passear. a dor complementar de eras acesa, logrando passagem em minhas vertigens, abrindo a gastrite ofensiva das minhas enfermarias usuais. não estabeleci limites entre a minha identidade e o aplacamento do amor : deixei de contemplar meus horrores, os dias frios, a correria exigida pela fúria de viver e os degraus soltos que particularizavam a minha estada. mas mesmo ali, o componente vivo de minhas misérias vinha se achegando lento, semi-suspenso naquele frasquinho em que depositara Deus e a minha contemplação. de beber o cálice daquele período nevoento, avivei as pedras, pra acolher as perdas. o sincretismo de um amor velado, estabelecido como uma doença, num apego que atraiçoa todo o emocional – acompridara vestes para esconder o furor reacionário de um erro que por anos seria esta história de luto e desvelo, para agora retirar os moldes daquele quadro perfeito, impraticável na expiação. minha novidade é o meu silêncio, um indício de anunciação. e na aura do que me alcança, hoje sobram ventos que ampliam o aconselhamento do ninho sem as burocracias oficiais que se espraiam no egoísmo da posse e da violação dos meus ideais. luto, me absolvo e reautorizo-me no mundo, com a venda dos olhos voltada ao desmascaramento marcado. assolados ao termo de eras, os heróis desta terra reúnem suas forças onde a fé se mantém nas frontes, sem frentes de violência e terrorismo. sou eu quem me sensibilizo e aprofundo as lacunas, interrompo os meus gladios, intercedo pelos gatos mancos esfomeados da tarde. há uma disputa covarde entre viver e se afeiçoar, entre o triste e o perdulário. há coisas perdidas, falidas com o tempo. há fios de luz de cordas engatadas donde as cotovias se suspendem e têm suas vidas desapropriadas. e há chamadas como as dos tempos escolares para encontrarmos o cisne imundo destas manhãs empoeiradas. existe um recesso no meu sentimento, uma modulação de hiatos que exige reposição - novas datas para recobrar os momentos tranquilos de que suspeitei, as glórias que contei por invernos e adiei em minha mente. recobrar as visitas no hall com toda sua alegria, comentando arquiteturas, relatando os últimos tempos. recobrar os dinossauros, o estetoscópio, o número infinitesimal, o caos, o açúcar e o arroz. o sumo desses dias. e além disso, saber que coisas caóticas não se relativizam com o tempo. são provas de audácia e descontentamento. quando há lebres fáceis os dias difíceis se comprovam. e mesmo na hora morta, há resgates em nossos arquivos.


(crédito de imagem: gabby nathan)

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